Mulheres na política: um grande desafio

Márcia Huçulak 

04/07/2023

Já completamos quase um-quarto do século 21 e ainda convivemos com forte preconceito contra as mulheres. Trata-se de um grande desafio, que tem muitas facetas a serem enfrentadas.
Recentemente, veio à tona que 40% dos partidos políticos descumpriram a cota mínima de 30% do financiamento para mulheres nas eleições do ano passado.
Mais de cinco anos depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) estabelecer o patamar mínimo (em 2018), ainda é preciso lutar para o cumprimento básico da lei.
Enquanto muitas mulheres vêm defendendo aumentar a participação feminina na política e nos espaços de poder – um grupo em que me incluo com muita ênfase –, por que ainda temos de lutar pelas cotas?
Nenhuma resposta dá conta da situação inteira. Algumas apontam direções: porque as mulheres não se interessam por política; mulher não vota em mulher; porque esse é um “assunto de homem”; porque política é uma área de competição e conchavos. As mulheres talvez sejam menos competitivas e mais colaborativas. Talvez não tenham o ânimo necessário para ficar brigando por espaços de tomada de decisão.
Pode ser um pouco de cada coisa, mas o fato é que os espaços na política deveriam ser naturalmente ocupados por homens e mulheres. Não fazemos a apologia das mulheres contra os homens, queremos participar das decisões que impactam a vida da população e nesse quesito não estamos representadas.
Paridade já deveria fazer parte do jogo.
Somos 51% da população, maioria das profissionais em vários setores (saúde, educação, assistência social, entre outras atividades), atuamos com destaque nas universidades e nas pesquisas científicas. Ainda que muito desproporcionalmente em relação aos homens, ocupamos muitos cargos relevantes na iniciativa privada e temos muitos exemplos destacados de ótimo desempenho na política.
Há competência, compromisso e entrega na atuação das mulheres.
Apesar disso, ainda somos segregadas nos espaços de poder e decisão. É incontornável o fato de que vivemos num mundo em geral hostil às mulheres, sofrendo violências de toda ordem: física, emocional, moral e sexual.
Esse cenário implica em que as mulheres têm de lutar em várias frentes ao mesmo tempo: por direitos básicos (salários iguais), contra violências (como os casos de feminicídio e violência de gênero) e, ainda, ver nossa capacidade profissional, política e de liderança permanentemente colocada à prova ou tratada com desdém e preconceito.
É comum que, num ambiente como esse, homens com muito menos capacidade ocupem cargos de maior peso para tomada de decisões apenas por serem homens – está aí a essência do preconceito.
Como reverter isso? Não me parece que haja soluções fáceis e imediatas.
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) divulgou recentemente pesquisa sobre o sexismo em 80 países – incluindo o Brasil, que tem alguns dados estarrecedores.
O levantamento apontou que 84,5% dos homens e mulheres brasileiros têm algum tipo de preconceito contra as mulheres. Sobra um mínino de 15,5% de gente sem preconceito (eram 10,2% há dez anos).
Quase 40% da população do país acredita que as mulheres não são políticas tão boas quanto os homens.
Os dados foram colhidos entre 2017 e 2022. D acordo com o PNUD houve estagnação no desenvolvimento rumo à igualdade de gêneros – ou seja, tivemos avanços, mas nos últimos anos menos, o que mantém as distorções por mais tempo.
Quando a população normaliza e aceita tratamento diferente decorrente apenas do gênero da pessoa é sinal que os esforços pela real paridade entre homens e mulheres não estão surtindo o efeito esperado nem na velocidade esperada.
O programa aponta o óbvio: os governos têm papel decisivo nas mudanças das normas sociais.
Segundo o Pnud, Alemanha, Uruguai, Nova Zelândia, Cingapura e Japão foram os países onde houve o maior incremento no número de pessoas sem viés de preconceitos de gênero.
Diante do quadro brasileiro, portanto, é importante destacar que há caminhos para vencer o problema. Contudo há que se discutir mais com a sociedade que futuro queremos para todas as pessoas.
Não há futuro numa sociedade onde só pelo fato de se nascer mulher, sem falar no recorte racial, étnico ou social, somos inferiores e precisamos afirmar o tempo todo nossa capacidade de liderança, de conhecimento e de poder.
Termino com a frase da ex-senadora norte-americana e política de grande influência Hilary Clinton: “As mulheres são o maior reservatório inexplorado de talentos do mundo”.
Se quisermos um mundo melhor deixem as mulheres ocupar espaços de poder e decisão.

*Márcia Huçulak, ex-secretária de Saúde de Curitiba, é deputada estadual pelo PSD (Partido Social Democrático). Tem mestrado em gestão de saúde pela Universidade de Londres e especialização pela Fundação Oswaldo Cruz.

Artigo publicado no portal Bem Paraná.

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